30.1.06

Mt 7, 1-5

«Não julgueis, e não sereis julgados. De facto, sereis julgados com o mesmo julgamento com que julgardes e sereis medidos com a mesma medida com que medirdes.
Porque olhas para o argueiro no olho do teu irmão e não prestas atenção à trave que está no teu próprio olho? Ou, como te atreves a dizer ao irmão: "Deixa-me tirar o argueiro do teu olho", quando tu mesmo tens uma trave no teu? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu próprio olho, e então verás bem para tirar o argueiro do olho do teu irmão».

12.1.06

A beleza

Numa certa cidade o arco-íris um dia apareceu e nunca mais se foi embora. Durante um ano permaneceu no mesmo sítio do céu. Tornou-se aborrecido.
Um dia, finalmente, o arco-íris desapareceu e o céu ficou cinzento escuro por completo. As crianças dessa cidade, excitadas, apontavam para o céu cinzento e gritavam uns para os outros: olha que bonito!
Gonçalo M. Tavares in O Senhor Brecht

8.1.06

Eros, Philos ou Ágape?

- Existem três palavras gregas para designar o amor - começou ele. - Hoje vês a manifestação de Eros, aquele sentimento entre duas pessoas.
Os noivos sorriam para os flashes e recebiam cumprimentos.
- Parece que os dois se amam - disse, referindo-se ao casal. - E acham que o amor é uma coisa que cresce. [...]
- Apesar de ser bom ou ser mau, a face de Eros nunca é a mesma em cada pessoa. Exactamente como as estrelas sobre as quais eu falava há meia hora atrás. E ninguém pode escapar a Eros. Todos têm necessidade da sua presença - apesar de muitas vezes Eros fazer com que nos sintamos distantes do mundo, fechados na nossa solidão. [...]
- Philos é o Amor sob a forma de amizade. É aquilo que eu sinto por ti e pelos outros. Quando a chama de Eros não consegue já brilhar, é Philos que mantém os casais juntos. [...]
- Hoje não é dia para falarmos de Ágape. Ágape está em Eros e em Philos, mas isso é apenas uma frase. Vamos divertir-nos nesta festa, sem tocar no Amor-que-Devora - e Petrus deitou mais vinho no seu copo de plástico. [...]
Todos nós corremos em busca de Eros, e quando Eros se quer transformar em Philos, achamos que o Amor é inútil. Sem perceber que Philos é que nos conduzirá até à forma do amor maior, Ágape. [...]
Petrus respondeu que Ágape não pode ser falado, precisava ser vivido. [...]
Ágape é o amor total, o Amor-que-Devora quem o experimenta. Quem conhece e experimenta Ágape, vê que nada mais neste mundo tem importância, apenas amar. Este foi o amor que Jesus sentiu pela humanidade, e foi tão grande que sacudiu as estrelas e mudou o curso da história do homem. A sua vida solitária conseguiu fazer o que reis, exércitos e impérios não conseguiram. [...]
- Ágape é o Amor-que-Devora - repetiu mais uma vez, como se esta fosse a frase que melhor definisse aquela estranha espécie de amor. - Luther King, certa vez, disse que quando Cristo falou de amar os inimigos, referia-se a Ágape. porque, segundo ele, era «impossível gostar dos nossos inimigos, daqueles que nos fazem mal, e que tentam amesquinhar o nosso sofrido dia-a-dia.» Mas Ágape é muito mais que gostar. É um sentimento que invade tudo, que preenche todas as frestas, e faz com que qualquer tentativa de agressão se torne pó.
Paulo Coelho in O Diário de Um Mago

2.1.06

In memoriam

Se conhecesses o mistério imenso do Céu onde agora vivo, este horizonte sem fim, esta luz que tudo reveste e penetra, não chorarias, se me amas!
Sto. Agostinho
A ti Filipe,
a quem a montanha levou nas asas da liberdade.
Hoje como no passado fazes-me falta...
Faz-me falta a tua alegria, meu Amigo.

1.1.06

A vida e o amor valem a pena

Não se vive sem meditar, imaginar e projectar a vida.
Creio que meditar é "fazer corpo com...": tecer as nossas relações com os outros, com Deus, e com os valores. Creio que a fé é a convicção de que a vida e o amor valem a pena; coisa que não se pode demonstrar, mas, quando nos arriscamos a viver como tal, estrutura-se a vida e brotam frutos de humanidade.
Só com a razão, ninguém sai de si próprio. Bem entendida, a fé nasce do afecto e da coragem de "imaginar": não da mera imaginação, mas do acto criativo, do "sonho" que nos leva a pôr um rosto humano nos nossos desejos, tornando-os possíveis e tornando-nos, a nós, capazes de lutar por eles.
Sem fé, sem um valor que dê sentido à vida, não se vive. E que vida seria essa que se pudesse resumir a um acumulado de alegrias e tristezas sem prazo e prontas a ir para o caixote quando menos se espera? A verdade é que se se vive humanamente é porque se tem fé: as pessoas é que, por vezes, não o sabem; ou não sabem dar-lhe o nome!
Vale a pena pensar nisto.
Vasco Pinto de Magalhães, s.j. in Não Há Soluções, Há Caminhos (Nota à 7°edição)